domingo, 13 de janeiro de 2013

O FASCÍNIO DE OLHAR




O olhar é uma curiosidade curiosa.

No mundo tudo parece estar voltado para o prazer do olhar, sedento em possuir todas as imagens.

O olhar devora as coisas, nada deixa fora de seu alcance.

Por estas razões, todos os mortais comportam-se sob o cuidado de não tropeçarem frente ao olhar alheio.

Não é a queda que nos incomoda, é o olhar do outro.

Desde cedo, queremos ver tudo.

Queremos ver o aparente e a essência das coisas.

Vivemos dessa tensão da realidade.

Contudo, somos decepcionados pela fragilidade da nossa percepção.

Não conseguimos ver tudo. O tudo e o todo nos escapam.

Por outro lado, a persistência do olhar permanece, pois o mundo nos entra por ele.

Como não satisfazemos todos os desejos, e nem seria possível saciá-los, o olhar

encaminha seu foco para outros mundos acessíveis.

Em uma sociedade como a nossa, mediática e sufocada pela poluição de imagens, nomeada de tantas maneiras, mas que poderia, também, ser chamada sociedade do olhar, a visão, enfadada pela  fixação compulsória de ícones e modelos de telerealidade, vê-se, de maneira abrupta, cerceada da sua fineza inerente.

O grotesco passa a ser o pano de fundo cultural do olhar.

Nesse sentido, a arte e o gosto estético são diluídos nos efêmeros produtos das fábricas de "sonhos".

Isso significa o roubo da capacidade de projetar na vida a dialogicidade do olhar, que, do mundo, extrai seus conteúdos e, depois, os retorna sob a perspectiva humana.

Derrubado de sua poética, de sua virtuosidade artística, o olhar é orientado para a

banalidade que se faz crer real.

Assim, os espetáculos de "realidade", despejados pelo mau gosto da indústria do entretenimento, atravessam, como uma espada, os olhos dos telespectadores.

E os olhos sangrados deixam de ver duplamente o que é invisível aos olhos, o essencial.

Um fato pouco notado nesse redimensionar do olhar, é o que acontece com o estatuto da condição humana.

Só admitimos observar e ver aquilo que acreditamos ser.

Se olhamos com gozo para algo, é porque nossa sensibilidade aceita ver-se no objeto visto, com altivez ou paridade.

O macabro e o horripilante afugentam o olhar.

O inumano cerra os olhos.

Mas os olhares mundiais parecem não achar horripilantes nem macabras algumas pessoas vigiadas,

experimentadas de maneira laboratorial entre quatro paredes. Muito ao contrário, regozijam-se

com o zoológico.

Com "sutileza" o mundo da mídia deram início a novos formatos da condição humana.

Quem poderia imaginar, algum dia, um zoológico humano? Pois é isso o que acontece agora.

Pessoas vigiadas por câmeras, vinte e quatro horas por dia, sinalizam os parâmetros de como

nos percebemos como pessoas e de como nos deixamos manipular pelos sistemas

mercadológicos, que estabelecem a prisão dos pretensos livres que pensam ver aprisionados,

mas são monitorados, pegos pela subjetividade "emancipada" na modernidade.

Vista com mais rigor, essa experiência do olhar, e o seu humano estabelecido, é o

rescaldo de idéias que permanecem no inconsciente coletivo de quem detém o poder de

trabalhar os bens de natureza simbólica.

Todas as vivências totalitárias passadas refletiram, a partir de "castas elevadíssimas", seres de categorias inferiores, manipuláveis e domesticáveis.

Nossa diferença, em relação ao passado, é que nos aceitamos todos sujeitos a estarmos, um

dia desses, nas grades dos olhos eletrônicos.

Damos consentimento fácil aos que querem transformar nossas consciências através das lisonjas da fama.

Deixamos o humano ser reduzido à fictícia realidade do zoológico, sem percebermos a armadilha de um dia sermos devorados pela falta de "humanos demasiados humanos".

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